RUMO À
TRAGÉDIA II
Ó barco
estulto, olha o teu fim
Olha as
rochas que te esperam, ásperas, cruéis
Sonhas?
Todos os sonhos são assim…
Porque em
sonhos firmas tuas leis
Quando
nessas espumas de marfim
É o mar o
rei dos outros reis?
Se hoje no
largo mar outras sereias
Te embalam
com acordes sonorosos
São
patranhas vãs, e nunca creias
Que outros
dias tenhas mais ditosos
Porque o
mundo por quem teces panaceias
Se firma em
rios de lama pantanosos
O
dinheiro-deus salvífica figura
Te força a
vogar assim perdido
E a andares
nas bravas ondas à procura
Do valor que
lhe era atribuído
Porque
trabalho algum lho assegura
Que não seja
pelo Homem produzido
Mas buscando
seu valor, buscas em vão
No dinheiro
não há sequer valor
Usurpou ao
trabalho essa função
Enquanto o
Homem foi seu produtor
Mas, com os
novos meios de produção
Não mais é
que nosso predador
No mundo do
Valor-Dissociação
Outro
futuro, ou barco não terás
Que as
profundezas do mar lá onde estão
Erros teus,
tuas leis, hostis e más
Porque o
Valor-Trabalho essa ilusão
Te mentiu,
se desfez e foi-se em paz
Como reger
agora o teu Mercado
Fiel
executor das regras tuas
Com o
trabalho assim desvalorado
Fora das
humanas forças que eram suas?
A pagar duro
tributo és obrigado
Que sem mais
sangue e dor não continuas
Que tripulação te leva e não duvida
Do perigo de
rumar um tanto à sorte
E segue
insensatamente convencida
Que o
dinheiro será sempre seu norte…
Pois sabe,
que o dinheiro, que tens por vida
Traz, sem
outra rota, a tua morte!
Pára barco
insano, pára um pouco
Força a
pensar teus nautas um momento
Neste imenso
mar que brama rouco
Solto nos
braços invisíveis do vento…
Pensa! E se
não és cego nem louco
Abandona
esse barco enquanto há tempo!
__Mas por
entre tanta bruma me dirão
Como posso
em firme terra pôr os pés
Sem que o
meu esforço seja em vão?
__É certo,
marinheiro, mas tu não vês
Que eu só
quero que vejas que a razão
Não está
nesse barco em que tu crês!
Tu viajas
num velho barco condenado
Um barco que
leva todas cores e raças
Que está
carunchoso e está esgotado
E concerto
não tem por mais que faças…
Por isso
muda o barco, ou naufragado,
Na imponente
rocha o despedaças!
Leonel
Santos
Lisboa,
Maio, 2012