O FOGO E A FLORESTA
1
Carências, invejas e rancor
Ganância e barbárie em crescimento
O desemprego, a seca, o sol, o vento
Todos sopram o fogo a seu favor
Na culminância cega do Valor
Tudo se sacrifica a seu contento
Até da própria V ida o valimento
Quando o lucro da Morte é superior
Dentro dum sistema irracional
Ninguém nos diz quanto o crime vale
Apenas a barbárie sussurra aos poucos
Que o fogo ávido que devora as serras
Tem o gérmen das drogas e das guerras
E o sonho que nos resta é o dos loucos
2
Espalha-se dos fogos o pregão
De contingência e risco acidental
Culpa-se o acaso, o raio, o vendaval
O vento que mudou de direcção
Convergência cega de ambição
Avidez de valor irracional
O fogo é valor comercial
O mito do valor em combustão
Fruto dum sistema corrompido
Feito de desespero e utopia
Que faz cada vez menos sentido
Venham, bombeiros, aviões, tecnologia
E o combate sai sempre perdido
Conforme manda a lei da mais-valia
3
Aqui onde o valor é a medida
Da miséria suprema e da grandeza
Onde se coteja, mede e pesa
Se vale mais a Morte ou mais a Vida
Onde a lei da selva é preferida
E a razão se pisa e se despreza
Onde aos milhões se morre de pobreza
Enquanto a riqueza é destruída
Aqui onde a «Civilização»
Manda queimar casas, gente e gado
E reduzir serras a carvão
Mas onde será sempre culpado
O vento, a pouca sorte, o sol, o verão
A bem do valor e do Mercado.
Leonel Santos
Abril, 2012