Leonel Santos - A SELVA




Certo dia um urso velho e experiente

Que vivia na selva há muitos anos

Começou a pensar se realmente

Era a selva dos ursos diferente

Da selva onde vivem os humanos



Sempre ouvira dizer a vida inteira

Que a selva humana tinha mais valor

Mas sempre pensou de outra maneira

Via a selva dos ursos mais ordeira

E eticamente superior



E por achar injusta a posição

Em que se encontrava a bicharada

O urso deu a volta à região

E convocou a todos sem excepção

Prà honra da selva ser lavada



Faltava atrair é natural

O predador humano a esta empresa

E o urso detestava este animal

Que por usurpação universal

Se apodava de rei da Natureza



Mas tantas voltas deu que um certo dia

Depois de ver gorados mil planos

O urso conseguiu aquilo que queria

E pôs a própria selva que o nutria

A discutir com a selva dos humanos



E foi ele o primeiro que com tristeza

Disse abertamente o que sentia

Impôs-me a dura lei da Natureza

Matar e devorar alguma presa

Para poder viver o dia a dia



Não tinha outro caminho, outra saída

Disse ainda o urso e se calou

E um leão rugiu logo em seguida

Que tinha também a mesma vida

Porque a Natureza o obrigou



Eu sempre procedi de forma honesta

Grasnou um abutre e com razão

Não mato ninguém, limpo a floresta

Mas para a selva humana sou a besta

E o bruto-a-montes do sertão



E ante a espécie humana ali presente

Alevantou ainda mais a voz

E disse, olhando os homens frente a frente

Vocês sempre foram e serão sempre

Bastante mais abutres do que nós



Comparem a diferença e a medida

Da corrupção na selva vossa

Com a nossa luta pela vida

E verão que é mais aguerrida

E muito mais selvagem do que a nossa



E se quiserem ter mais harmonia

Venham viver connosco aqui na selva

Disse p'ra assistência que o ouvia

Um dos porcos bravos que assistia

Enquanto retouçava alguma relva



Nós temos de matar disse chacal

Mas na perfídia dos chacais

Não há o instinto habitual

Que tem a vossa selva racional

De viver a matar os seus iguais



E se em minha selva há mal-estar

Muito mais longe a vossa está do bem

Não foram os chacais a inventar

Os tigres, a hiena, o jaguar

As bombas que a vossa selva tem

As guerras do Valor e de Rapina

Que a vossa selva trava noite e dia

E tudo quanto ela congemina

Envergonham a nossa lei felina

E a selva que nos guarda e que nos cria



Nessa altura surgiu um jacaré

A defender a selva em que vivia

Chegara extenuado da Guiné

Julgando os presentes que ele até

Estava adormecido e não ouvia



Falou da selva humana e com desdém

A chamou de selva repelente

Como a paz não dá lucro a ninguém

Vendeis a guerra que o mantém

E o Mercado flui matando gente



E falando por fim com mais rigor

Disse para os outros animais

Que nenhuma selva era pior

Que a SELVA HUMANA DO VALOR

No ventre das selvas mundiais



Leonel Santos

Abril de 2008