Leonel Santos - A TRAGÉDIA DE PLUTO


A TRAGÉDIA DE PLUTO


Já o sol cai por trás das montanhas
Se alongam sombras e desfalece a luz
E por todo o lado a noite reproduz
Figuras negras de formas estranhas
Mas no seio da terra, no coração das brenhas
Onde a treva densa nunca se reduz
Pluto avança contra os rochedos crus
Rebuscando ouro nas suas entranhas

Deus cego, da Riqueza, do Ouro e do Dinheiro
Noite e dia fareja o mítico Valor
A «abstracção real» de quem é protector
E a que vive curvado o mundo inteiro
Vemo-lo agora já, trémulo carcereiro
Arrastando-se a custo e sem vigor
Restam-lhe as bombas de cunho superior
Para se matar depois, de nos matar primeiro

Nada aprende-mos… nada…com Midas e Creso
E muitas mais riquezas que passaram
Experiências mil se condenaram
Ou condenadas foram a vil desprezo
Neste Sistema estéril e indefeso
Tortas e cegas vias se cruzaram
E do jugo desses tempos que ficaram
Carregamos ainda o mesmo peso

Nada mais tem valor, nada mais vale
Pluto sucumbiu ao valimento
A máquina parou seu movimento
E o Homem parou de modo igual
E nesta paragem irracional
Só a morte detém nosso tormento
No mundo de Pluto é ele o centro
Tudo o que é princípio e é final

Foi este herói e deus guerreiro
Que escavou o Oeste americano
E por sede de ouro o vil tirano
Extinguiu do Peru o povo inteiro
E no sertão o índio brasileiro
Igual sorte teve ao Araucano
Se esta via seguimos, se este engano
Pluto prosseguirá nosso coveiro

Se inda o vemos sorrir e ter esperança
Lá no mais alto cume onde subiu
Vemo-lo também subir, se não caiu
Pois também não lhe abona a confiança
Se mais tenta correr menos alcança
Sua excelsa força se deliu
Quem o vê agora e quem o viu
Será forçado a ver essa mudança

Mas não se deprecie a dura luta
De concepções e sombras ideais
Se inda piores e mais brutais
São ideias vãs em lide bruta
Cabe-nos vencer a nós essa disputa
Em formas e termos racionais
Que para livres ser sem ser iguais
Humana tem de ser nossa conduta

Pluto, velho navio sem direcção
Pr’a onde remas tu sem nossos braços
Por ondas cada vez com mores espaços
Se à tua volta engrossa a escuridão  
O teu rumo é cruel e vão
O teu Dinheiro herança de fracassos
Um mundo rasgado em mil pedaços
Na tua trajectória de Ilusão!

Leonel Santos
Lisboa, Fevereiro 2012